Processo nº 528-52.2009.
8.10.0038 (5282009)
Ação de SERVIDÃO
ADMINISTRATIVA
Requerente: CONSÓRCIO ESTREITO ENERGIA -
CESTE
Requerido: JOÃO LUCIANO DE ABREU MATOS
JUNIOR
SENTENÇA
I - RELATÓRIO
Cuida-se
de Ação de Instituição de Servidão Administrativa ajuizada por CONSÓRCIO ESTREITO ENERGIA – CESTE,
constituído pela empresas CARMARGO CORREA GERAÇÃO DE ENERGIA S/A, VALE S/A E
SUEZ ENERGIA RENOVÁVEL S/A em face
do JOÃO LUCIANO DE ABREU MATOS JUNIOR,
ambos devidamente qualificados nos autos.
Narra
a exordial que a autora é concessionária de serviço público federal,
responsável pela implantação de Linha transmissão de energia elétrica entre os
municípios de Estreito e Imperatriz/MA com extensão aproximada de 141 km e que
foi publicada a Resolução Autorizativa nº 1047, de 09 de julho de 2009, da
ANEEL declarando de utilidade pública para fins de instituição de servidão
administrativa em favor da autora as áreas de terras necessárias à implantação
da linha de transmissão supracitada e autorizando a invocação do caráter de
urgência para fins de imissão provisória na posse do bem, nos termos do art. 15
do Dec-Lei nº 3365/41.
Prossegue
afirmando que dentre as áreas atingidas encontra-se o imóvel do réu, a quem a
autora tentou indenizar amigavelmente pela restrição do uso, mas não obteve
êxito, motivo pelo qual ingressou com a presente ação, requerendo, ainda, a
imissão provisória na posse tendo em vista a necessidade de cumprimento do
cronograma do empreendimento, tendo avaliado a área objeto do litígio (6,19ha)
em R$ 115.432,88, valor esse que foi oferecido a título de depósito prévio
conforme exigência do DEC – LEI nº 3365/41.
Finaliza
o autor requerendo a imissão provisória na posse da área de 6,1957ha, parte de
um todo maior de 16,9854 ha, denominado CHACARA MAISSALUM, descrita na inicial;
expedição de mandado para registro da imissão provisória na posse; e no mérito,
requer a procedência da demanda para constituir definitivamente o imóvel em
favor dos autores mediante o pagamento da quantia de R$ 115.432,88. Juntou
quesitos para parecia e documentos de fls. 17-192.
Às
fls. 193-195, o juízo da 2ª Vara desta comarca declina da competência para este
juízo.
Às
fls. 197-203, este juízo concedeu a liminar autorizando a imissão provisória na
posse em favor das autoras e determinando a citação do réu e intimação por
edital de terceiros eventualmente interessados.
Às
fls 205-206, a autora junta aos autos o comprovante de depósito prévio no valor
de R$ 115.432,88.
Às
fls. 210, consta o auto de imissão provisória na posse.
Às
fls. 236, o réu foi devidamente citado.
Às
fls. 246, a parte autora informa que agravou da decisão de concessão da
liminar.
Às
fls. 268-284, o réu apresentou contestação oportunidade em que alegou que o
imóvel pretendido encontra-se alugado para o Estado do Maranhão onde funciona o
2º Esquadrão de Polícia Montada – EPMONT; que a postura do autor não prezou
pela conciliação; que a imissão provisória na posse foi concedida com base em
inverdades do autor; que grande parte do terreno objeto da servidão administrativa
não possui qualquer gravame e portanto deveria ser objeto de indenização prévia
e justa; que a perícia foi elaborada de forma unilateral pelos autores que são
interessados na desvalorização do imóvel do réu; que os autores misturam o
interesse público com o seu próprio interesse privado; que o depósito prévio
deveria ser de no mínimo vinte vezes o valor oferecido; que o imóvel pretendido
se caracteriza como imóvel urbano; que somente o valor da terra nua pretendida
deveria corresponder a R$ 371.745,00; que o valor do imóvel inteiro corresponde
a R$ 1.400.000,00; que parte da área atingida pela servidão está na posse do
réu, mas é de propriedade de terceiro chamado VICENTE DE OLIVEIRA ANDRADE;
FINALIZA REQUERENDO a elevação do valor do depósito prévio em pelo menos 20
vezes; a fixação de multa diária pelo descumprimento da decisão; a realização
de perícia para a apuração do valor real do imóvel e do valor da área atingida
pela servidão administrativa.
Juntou
documentos de fls. 286-327.
Às
fls. 332-350, os autores apresentaram réplica, oportunidade em que suscita que
o âmbito de discussão da presente ação se limita a questões relativas a
nulidade processual e ao preço do bem a ser desapropriado, nos termos do art.
20 do Dec-Lei nº 3365/41; que quanto à discussão da liminar de imissão
provisória da posse a matéria já estaria preclusa nos autos, pois o seu agravo
sequer foi conhecido e que a imissão já é fato consumado; que o réu limitou-se
a discordar dos cálculos apresentados em perícia pelos autores sem juntar
nenhum embasamento técnico para tanto; que o laudo dos autores, ao contrário,
foi elaborado por engenheiros agrônomos e respeitando as regras constantes da
ABNT; que não há que se falar em qualquer depósito complementar; que a
controvérsia deve ser sanada por perícia judicial; que o autor alega que o
imóvel está situado em área urbana, mas no registro imobiliário do mesmo não há
qualquer indicação nesse sentido; que o laudo apresentado demonstra que o
imóvel tem destinação rural, conforme o art. 4º do Estatuto da Terra; que não
prova do dano material alegado; que a alegação de que parte da área destinada a
servidão pertence a matrícula diversa não altera o valor da indenização; que
caso venha a ficar demonstrado tal fato o terceiro titular do domínio deve ser
chamado para integrar a lide; que o réu confunde servidão administrativa com
desapropriação de forma que não se pode atribuir o valor de mercado do bem como
se houvesse uma desapropriação, devendo ser utilizado uma coeficiente de servidão;
que os honorários não são devidos ou se devidos devem ser limitar ao percentual
de 0,5% a 5% sobre a diferença entre o preço ofertado e o valor da condenação
nos termos do art. 27, §1º do dec-Lei nº 3365/41; que os juros compensatórios
devem ser apurados entre diferença entre o preço ofertado e a condenação e
limitados a 12% a.a; os juros moratórios devem ser fixados em 6%a.a a partir de
01.01 do ano seguinte ao que o pagamento deveria ter sido feito; correção
monetária pelo INPC.
Às
fls. 363 realizou-se audiência de conciliação a qual restou inexitosa, tendo
sido determinada a realização de perícia para aferir o valor da área atingida
pela servidão.
Às
fls. 402 o réu junta comprovante do trânsito em julgado da ação de dissolução
de sociedade de fato conferindo a integridade do imóvel objeto de servidão para
o réu.
Às
fls. 424, foi autorizada a expedição de alvará em favor do réu relativo ao
depósito prévio.
Às
fls. 442 foi nomeado perito.
Às
fls.448, as autoras pedem a retificação do pólo ativo para fazer constar a
alteração contratual de forma que integram o consórcio autor as empresas
COMPANHIA ENERGÉTICA ESTREITO, VALE S/A, ESTREITO ENERGIA S/A E INTERCEMENT
BRASIL S/A.
ÀS
FLS. 579 determinou-se a intimação das partes para recolherem os honorários
periciais e determinou-se a retificação do pólo ativo.
Às
fls. 601-v, consta despacho determinando a intimação do perito para assinatura
de termo de compromisso e das partes para apresentarem quesitos e indicarem
assistente técnico.
Às
fls. 608-613 os autores nomearam assistentes técnicos e fizeram quesitos.
Às
fls. 614-617, o réu apresentou quesitos.
Às
fls. 625-653, o perito apresentou laudo pericial.
Às
fls. 685 foi determinada a intimação das partes para falarem sobre o laudo
pericial e designada audiência de instrução.
Às
fls. 698-713, os autores criticam o laudo do perito judicial afirmando
basicamente que o mesmo fez a avaliação baseada em premissas falsas já que não
se trata de imóvel urbano, mas sim rural; que o perito presumiu a hipotética
destinação do imóvel para fins de loteamento o que encontra vedação no art. 42
da lei nº 6766/79; que não se trata de desapropriação, mas sim, de servidão
administrativa de forma que seria obrigatória a fixação de um coeficiente de
servidão ao preço da avaliação do imóvel.
Às
fls. 720-722 realizou-se audiência de instrução, oportunidade em que foi ouvido
o perito e requisitou-se informações ao município de João Lisboa acerca da
localização do imóvel para que a municipalidade informasse se o mesmo se
encontrava em zona urbana ou zona rural conforme a legislação municipal.
Às
fls. 725, o município informa que com o advento da Lei municipal nº 09/2015, o
imóvel discutido encontra-se localizado na Zona Urbana de João Lisboa.
ÀS
fls. 732-743, as autoras apresentaram alegações finais oportunidade em que
sustentaram que o montante indenizatório encontrado pelo perito judicial é
absurdo (R$ 1.034.555,22), pois refere-se a um imóvel urbano e potencialmente
loteável, mas sequer há ainda hoje qualquer parcelamento de solo aprovado junto
ao Município; que o nosso ordenamento somente contempla a indenização pelo dano
certo e não pelo dano eventual ou incerto; que a caracterização de um imóvel
como rural, segundo o Estatuto da Terra dá-se com a análise de sua destinação
econômica e não pelo sua localização; que não cabe qualquer sobrepreço
decorrente do parcelamento do solo ou decorrente da condição de imóvel urbano;
que segundo o ofício do município o imóvel somente passou a ser fazer parte da
zona urbana em 26.08.2015, data posterior à publicação da Resolução
Autorizativa nº 1947 da ANEEL e até mesmo à data da perícia que se realizou em
20.08.2014; que o valor máximo da terra nua deve ser de R$ 4.500,00/ha com
aplicação do coeficiente de servidão de 68%, chegando-se ao valor de R$
18.959,99, conforme laudo de fls. 93; que na jurisprudência o coeficiente de
servidão varia entre 10% e 30% do valor do imóvel; que a servidão não se
confunde com a desapropriação; que são
incabíveis os juros compensatórios em sede de servidão administrativa já que o
proprietário não é desapossado, mas se cabíveis devem se limitar a 12% a.a e
devem incidir somente sobre a diferença entre o preço ofertado e o valor da condenação
contido na sentença, nos termos do art. 15-A do DEC-Lei nº 3365/41; que os
juros compensatórios não se cumulam com lucros cessantes; os juros moratórios
devem ser fixados em 6%a.a. a partir do exercício seguinte ao trânsito em
julgado da sentença; que eventuais honorários advocatícios devem se limitar a
0,5 a 5% sobre a diferença entre o preço e a condenação; finaliza requerendo o
afastamento da avaliação do perito judicial e a aplicação do coeficiente de
servidão de 68¨%.
Às
fls. 745-755 o réu apresentou alegações finais oportunidade em que alegou que o
imóvel se encontra em área urbana e com destinação urbana; que o laudo pericial
é válido e se baseou em critério objetivos tendo considerado o imóvel urbano em
razão de sua destinação econômica; que desconsiderar a qualificação de urbano
ao imóvel configuraria verdadeiro confisco de terras; que o perito não
considerou o imóvel loteado; que o que o perito sugeriu foi uma conversão de
uma servidão em uma desapropriação tendo em vista o nível de comprometimento do
imóvel urbano; que o imóvel foi adquirido com finalidade residencial e
posteriormente foi alugado para a Cavalaria da PMMA; que o imóvel não se
destina a atividade agrícola; que a legislação municipal não deve ser levada em
consideração para a caracterização do imóvel como urbano ou rural, já que o
critério é o da destinação econômica; que o valor da indenização deve ser o
mais justo possível; que deverão incidir juros compensatórios. Finaliza
requerendo a improcedência da ação com o pagamento da indenização nos termos
propostos pelo perito judicial e fixando-se a indenização no valor de R$ 1.100.000,00,
além do pagamento de 10% pela desvalorização da área remanescente; juros de
mora de 6% a.a.; juros compensatórios de 12% a.a. e honorários advocatícios.
Vieram
os autos conclusos.
É
o relatório. Decido.
II - FUNDAMENTAÇÃO
MÉRITO
Tratam
os autos de ação de constituição
de servidão administrativa através da qual pretende a autora a imissão
definitiva na posse do imóvel descrito na inicial, bem como a constituição
de servidão sobre as faixas de terreno indicadas, necessárias à construção e à
passagem de LINHA DE TRANSMISSÃO DE ENERGIA ELETRICA situado entre os
municípios de Estreito/MA e Imperatriz/MA.
Como
sabido, a servidão administrativa é o direito real público que autoriza o Poder
Público a usar imóvel de propriedade alheia para permitir a execução de obras e
serviços de interesse coletivo. Ao contrário da desapropriação, a servidão
administrativa não enseja a perda da propriedade.
Segundo
a lição de José dos Santos Carvalho Filho:
"A regra reside em que a servidão administrativa não rende ensejo à indenização se o uso pelo Poder Público não provoca prejuízo ao proprietário. Segue-se daí que, se o direito real de uso provocar prejuízo ao dominus, deverá ser este indenizado em montante equivalente ao mesmo prejuízo. É bom lembrar que o ônus da prova cabe ao proprietário. A ele cabe provar o prejuízo; não o fazendo, presume-se que a servidão não produz qualquer prejuízo.
(...)
O importante é que o proprietário seja indenizado pelo uso, quando de alguma forma sofre restrições no gozo do domínio" (Manual de Direito Administrativo, 24ª ed., Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, p.722/723).
O importante é que o proprietário seja indenizado pelo uso, quando de alguma forma sofre restrições no gozo do domínio" (Manual de Direito Administrativo, 24ª ed., Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, p.722/723).
Após
detida análise dos autos, vê-se que as partes não discutem sobre a instituição
da servidão administrativa destinada à implementação da referida LINHA DE
TRANSMISSÃO em terreno de propriedade do réu, a qual foi regularmente precedida
de ato declaratório consistente na Resolução Autorizativa nº 1947 de 09 de
junho de 2009, da Agencia Nacional de Energia Elétrica – ANEEL (fls. 67).
A
controvérsia a ser aqui pacificada cinge-se tão somente aos critérios
utilizados pelo perito judicial para arbitrar o quantum da indenização a ser
paga ao réu, com o qual não concordaram os autores basicamente por entenderem
que o imóvel não poderia ser classificado como URBANO, muito menos levar em
consideração eventual potencialidade para loteamento futuro e, ainda, por ter
deixado de considerar que estar-se diante de uma servidão administrativa e não
de desapropriação de forma que não houve aplicação do chamado COEFICIENTE DE
SERVIDÃO.
Como
se sabe, a instituição da servidão administrativa não exclui o direito do
proprietário ao uso do bem, desde que tal seja compatível com a dita servidão,
sendo certo que para se apurar o valor da indenização justa deve ser
considerado o prejuízo real e efetivo suportado pela propriedade serviente,
inclusive a depreciação econômica acarretada ao imóvel, em face de sua normal
destinação econômica ou de suas finalidades recreativas; não se indeniza dano
suposto, eventual ou futuro, mas somente aqueles diretos, atuais e efetivos,
suportados pela propriedade.
Neste
caso concreto, a área de servidão em faixa de terreno de propriedade do réu é
de 6,1957 ha, parte de um
todo maior de 16,9854 ha denominada “CHACARA MAISSALUM” a qual foi
ofertada a importância de R$115.432,88
(cento e quinze mil, quatrocentos e trinta e dois reais e oitenta e oito
centavos), valor este que, segundo a autora, observou minucioso critério
segundo laudo de avaliação de fls. 87-174, englobando a SERVIDÃO SOBRE TERRA
NUA com percentual de depreciação de 68% sobre o valor da área atingida (R$
18.958,99), CULTURAS TEMPORÁRIAS (R$ 8.490,24) E BENFEITORIAS
NÃO-REPRODUTIVAS/CONSTRUÇÕES (R$ 115.432,88).
O
perito judicial, por sua vez, em seu laudo oficial (fls.625-667), arbitrou a
título de indenização pela instituição da servidão administrativa objeto dos
autos o valor de R$1.083.910,22 (um milhão, oitocentos e oitenta e três mil,
novecentos e dez reais e vinte e dois centavos), sendo R$ 880.000,00 pela TERRA
NUA, R$ 13.601,72 pelas BENFEITORIAS REPRODUTIVAS e R$ 140.953,50 pelas
BENFEITORIAS NÃO-REPRODUTIVAS, ESTES ÚLTIMOS EM VALORES ATUALIZADOS ATÉ
28.10.2015.(FLS. 653)
DA INDENIZAÇÃO DAS
BENFEITORIAS
QUANTO AO VALOR DAS
BENFEITORIAS REPRODUTIVAS E NÃO REPRODUTIVAS percebo que o mesmo
restou incontroverso nos autos, conforme se observa da manifestação dos autores
às fls. 711 e da concordância do réu com a integralidade do laudo do perito
judicial em suas alegações finais.
DO VALOR DA TERRA NUA
QUANTO AO VALOR DA TERRA NUA é
certo que o perito judicial deixou bem claro em seu laudo que considerou o
imóvel como sendo URBANO e não levou em consideração qualquer fator de
depreciação, pois entendeu que a servidão administrativa caracterizou
verdadeira DESAPROPRIAÇÃO.
Entendo
que o perito excedeu-se em suas considerações ao concluir que se tratava de
DESAPROPRIAÇÃO já que fora nomeado com a finalidade especifica de avaliar o
imóvel objeto da presente ação e assim, caberia a mesmo limitar-se a sua função
de avaliador.
Como
regra, a SERVIDÃO ADMINISTRATIVA enseja apenas o uso da propriedade alheia para
possibilitar a execução de serviços públicos, não ensejando a perda da
propriedade como na desapropriação. Como na SERVIDÃO ADMINISTRATIVA somente há
o uso de parte de propriedade, o sistema indenizatório tem delineamento
jurídico diversa da desapropriação.
Assim,
como regra a SERVIDÃO ADMINISTRATIVA não rende ensejo à indenização pelo uso do
Poder Público se não provocar prejuízo ao proprietário. Caso contrario, este
ultimo terá direito à ser indenizado na medida da extensão do dano.
É
evidente que a instituição de LINHA DE TRANSMISSÃO limita o uso da propriedade
do réu e lhe causou prejuízos já que teve demolidas as suas benfeitorias e
ficou impedido de utilizar plenamente relevante área de sua propriedade,
aproximadamente 37% (fls. 630).
Assim,
é devida a indenização cujo valor, relativamente à TERRA NUA, deve sofrer
decote relativo ao COEFICIENTE DE DEPRECIAÇÃO correspondente a 68%,
considerando que o perito judicial apontou 63% às fls. 632 e os autores 68% às
fls. 742-743, percentual esse mais favorável ao réu.
Portanto,
a única controvérsia remanescente nos autos é quanto ao valor da TERRA NUA
sobre o qual incidirá o referido fator de depreciação.
Segundo
os autores o imóvel jamais poderia ser avaliado como imóvel urbano, pois a sua
finalidade econômica apresenta características de imóvel rural, sendo essa a
diretriz contida no Estatuto da Terra (art. 4º, I da Lei nº 4504/64) e na Lei
de Reforma Agrária (art. 4º, I da Lei nº 8629/93) e também não poderia levar em
consideração eventual potencial do mesmo para loteamento, já que isso encontra vedação
expressa na Lei do Parcelamento do Solo Urbano (art. 42, da Lei nº 6766/79).
Para o réu o imóvel deve ser considerado urbano e a indenização deve ser total
pois estaria equiparada a uma verdadeira desapropriação.
Colaciono
os referidos dispositivos:
“Art. 4º Para os efeitos desta Lei, definem-se:
I - "Imóvel
Rural", o prédio rústico, de área contínua qualquer que seja a sua
localização que se destina à exploração extrativa agrícola, pecuária ou
agro-industrial, quer através de planos públicos de valorização, quer através
de iniciativa privada;”
Lei
da Reforma Agrária (Lei nº 8629/93)
“Art. 4º Para os efeitos desta lei, conceituam-se:
I- Imóvel Rural - o prédio rústico de área
contínua, qualquer que seja a sua localização, que se destine ou possa se
destinar à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou
agro-industrial;”
Lei
do Parcelamento do Solo Urbano (Lei nº 6766/79)
“Art. 42. Nas desapropriações
não serão considerados como loteados ou loteáveis, para fins de indenização, os
terrenos ainda não vendidos ou compromissados, objeto de loteamento ou
desmembramento não registrado.”
Em
sede de SERVIDÃO ADMINISTRATIVA, na acepção verdadeira do instituto, a
indenização nunca poderá corresponder ao valor do imóvel em si, uma vez que não
há perda da propriedade. O importante é que o proprietário seja indenizado pelo
uso, quando de alguma forma sofre restrições no gozo do domínio.
No
presente caso, não se pode concluir que a SERVIDÃO administrativa simulou
verdadeira desapropriação, pois o proprietário não ficou privado do uso do bem
gravado com servidão. Ao contrário, ele permaneceu dando a mesma destinação que
o dava desde o ano de 2009, qual seja, o aluguel para as instalações do 2º
EPMONT – ESQUADRÃO DE POLICIA MILITAR MONTADA DA PMMA, situação que já perdura
a mais de 08 anos (fls. 636), além do que o perito respondeu quanto às
limitações ao direito de propriedade e exploração econômica do imóvel que na
faixa de servidão ainda seria “permitida a cultura de cereais, horticultura,
floricultura, fruticultura e pastagens, desde que constituída de espécies cuja
altura máxima, na idade adulta, garanta que a distância do condutor mais baixo
à vegetação nunca seja inferior a 5 metros”(fls. 645).
Quanto à caracterização do
imóvel como urbano ou rural não estou convencido de que tal fato
seja determinante para a aferição da chamada INDENIZAÇÃO JUSTA, PRÉVIA e EM
DINHEIRO (CF, art. 5º, XXIV), merecendo relevo, desde o meu olhar, a data da
imissão na posse e valor de mercado praticado nos imóveis vizinhos na referida
época.
Dispõe
o art. 5º, XXIV da CF:
“Art.
5º. (...)
XXIV – a lei
estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade
pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em
dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição;”
Indenização
prévia é aquela que é ultimada antes da consumação da transferência do bem ou,
no caso da servidão, do seu registro.
Indenização
justa, conforme anota CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO, “é aquela que
corresponde real e efetivamente ao valor do bem expropriado, ou seja, aquela
cuja importância deixe o expropriado absolutamente indene, sem prejuízo algum
para o seu patrimônio”. Esta deve abranger os danos emergentes, lucros
cessantes, juros moratórios e compensatórios, a atualização monetária, as
despesas judiciais e honorários advocatícios.
Analisando
os autos, percebo que o perito judicial foi cuidadoso ao proceder a uma
pesquisa de campo com dados de mercado com localização dos imóveis pesquisados
reunindo às fls. 655 um levantamento de dados de mercado relativo a oito
imóveis semelhantes sendo 4 já negociados e 4 em situação de oferta, tendo
chegado ao valor médio de R$ 15,00/m².
Em
princípio, deve prevalecer o valor do m² apontado no laudo pericial a título de
indenização da TERRA NUA, mormente quando aquele não é contrariado por prova
inequívoca em contrário, fazendo presumir, por se tratar de matéria
eminentemente técnica, que se mostra condizente com a situação do bem que
sofreu a SERVIDÃO ADMINISTRATIVA.
Assim,
acompanhando a sugestão constante da avaliação do perito (fls. 650), considerando
que a faixa do imóvel sujeita a servidão é de 6,1957 ha ou 61.957 m² tal valor
multiplicado pelo valor do m² homologado por este juízo para o imóvel (R$
15,00), chega-se ao valor de indenização da TERRA NUA de R$ 929.355,00. Os
valores a título de benfeitorias restaram incontroversos em R$ 154.555,22.
Somando os valores sobre o qual deve ser considerado o percentual de 80% a
título de liquidez forçada apurado pelo perito (fls. 650), chega-se ao valor de
R$ 880.000,00.
Sobre
o valor apurado deve incidir o COEFICIENTE DE SERVIDÃO ADMINISTRATIVA, já que
inexiste transferência do domínio e o réu permanece fazendo uso – com algumas
restrições – da faixa de servidão, no percentual de 68% do valor da avaliação
do perito, conforme fundamentação retro, o que implica numa JUSTA INDENIZAÇÃO
DO VALOR DE R$ 598.400,00 (Quinhentos e noventa e oito mil e quatrocentos
reais), valor que inclui a TERRA NUA, BENFEITORIAS REPRODUTIVAS E BENFEITORIAS
NÃO REPRODUTIVAS, valor esse já atualizado até a data de emissão do LAUDO
PERICIAL, qual seja, 20.02.2016 (fls. 650).
De
fato, em que pese o inconformismo dos autores, in casu, é de se acolher o valor apontado no laudo oficial, segundo
a metodologia aplicada, porquanto restou suficientemente fundamentado e
elaborado por perito da confiança do juízo, equidistante dos interesses das
partes.
Assim,
nas circunstâncias específicas do caso em questão, ausentes outros elementos
imparciais de convicção, desde o meu olhar o laudo do perito oficial merece
prestígio, o qual também atestou que inexistiu depreciação da área
remanescente, isto é, a área total do imóvel subtraída daquela diretamente
afetada pela servidão administrativa.
Inclusive,
o art. 27 do
Decreto-Lei 3.365/41, aplicável à servidão
administrativa por força do art. 40 do mesmo
diploma, é expresso ao dispor que:
"Art.
27. O juiz indicará na sentença os fatos que motivaram o seu convencimento e
deverá atender, especialmente, à estimação dos bens para efeitos fiscais; ao
preço de aquisição e interesse que deles aufere o proprietário; à sua situação,
estado de conservação e segurança; ao valor venal dos da mesma espécie, nos
últimos cinco anos, e à valorização ou depreciação de área remanescente,
pertencente ao réu."
Com
efeito, a apreciação conjunta do laudo pericial, dos pareceres dos assistentes
técnicos e das demais provas produzidas nos autos, revela que a perícia
judicial, foi realizada ante as particularidades da área alcançada pela
servidão administrativa, apontando o Perito, na identificação do montante da
indenização, valor compatível com a localização do imóvel, sua destinação econômica.
Ressalte-se,
por fim, que é princípio assente que a indenização, quando devida, deve ser a
mais integral possível e para tanto deve refletir o valor do efetivo prejuízo
causado ao imóvel.
III - DISPOSITIVO:
ANTE O EXPOSTO,
com fulcro no art. 387, inciso I, do CPC, JULGO
PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido do autor para CONSTITUIR DEFINITIVAMENTE
favor das autoras COMPANHIA ENERGÉTICA ESTREITO, VALE S/A, ESTREITO ENERGIA S/A
E INTERCEMENT BRASIL S/A a servidão administrativa da área descrita na inicial.
Condeno, entretanto, as autoras a pagar a título de JUSTA INDENIZAÇÃO pelos
prejuízos efetivamente sofridos pelo réu JOÃO LUCIANO DE ABREU MATOS, já
qualificado, em função da instituição da referida servidão, o valor de R$
598.400,00 (quinhentos e noventa e oito mil e quatrocentos reais), já atualizado
até a data de emissão do laudo de avaliação (20.02.2016). Autorizo desde logo
que sobre o valor da condenação seja decotado o valor já antecipado a título de
depósito prévio e integralmente levantado pelo réu. Sobre a diferença entre
o valor da condenação e o valor do depósito prévio incidirá CORREÇÃO
MONETÁRIA PELO INPC a contar da data do laudo (20.02.2016); JUROS
MORATÓRIOS de 0,5% (zero vírgula cinco por cento) ao mês a contar do transito
em julgado, nos termos do art. 15-B do DEC-LEI Nº 3365/194, considerando
que o expropriante não é a Fazenda Pública, mas uma concessionária de serviço
público; E JUROS COMPENSATÓRIOS de 1% a.m a contar da data da imissão na posse,
qual seja, 27.08.2009 (fls. 210), nos termos da Sumula nº 408 do STJ.
Condeno
o autor ao pagamento de honorários advocatícios na ordem de 5% (cinco por cento)
sobre a diferença entre o valor da condenação e o valor do depósito prévio,
considerando o zelo, o tempo na atuação, a complexidade da causa e natureza e
importância do trabalho realizado, nos termos do art. 27, §1º do DEC-LEI Nº
3365/41.
Condeno
o autor em custas e despesas processuais.
Publique-se. Registre-se. Intime-se.
João Lisboa/MA, 10 de
novembro de 2016.
Juiz Glender Malheiros Guimarães
Titular da 1ª Vara da Comarca de João Lisboa