quarta-feira, 20 de junho de 2012

SENTENÇA. AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRANSITO. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. IMPROCEDÊNCIA


PROC. 517/2008
SENTENÇA
1- RELATÓRIO.

CHARLEIS BARBOSA BARROS e FRANCISCO PEREIRA CAVALCANTE, através de advogado constituído, ajuizou a presente AÇÃO DE RESPONSABIIDADE CIVIL POR ATO ILÍCITO, em face de VANDERLY GOMES MIRANDA, pelos fatos e fundamentos expendidos a seguir.
Que os requerentes são genitores de PAULO JUNIO BARROS CAVALCANTE, nascido em 28.11.2006, tendo sido privados do convívio com o seu filho em 29.07.2008, por volta das 16:30h, quando o mesmo faleceu vitima de acidente de trânsito ocorrido na Rua 31 de março, próximo ao Forum desta cidade, tendo como causa mortis “parada cárdio-respiratória, traumatismo crânio encefálico” em decorrência de atropelamento em via pública pelo veículo GM/D20 CUSTOM S, PLACAS BNO 4451, ANO 1993/1993, CHASSI 9BG244NAPPC025149, conduzida pelo requerido VANDERLY GOMES MIRANDA, qualificado às fls. 02.
Afirma que a vítima possuía apenas 01 ano e 08 meses na época do acidente e que gozava de perfeita saúde e que tal fato privou os autores do amor, carinho e alegria de ter o filho consigo, fato que lhes causou profunda dor, diante da perda de um ente querido, suscetível de reparação por danos morais.
Imputa a responsabilidade do acidente a  culpa exclusiva do condutor do veículo uma vez que segundo o laudo do “auto de verificação de local de acidente de trânsito” o fato teria “como a causa o fato de condutor da unidade V1 está conduzindo seu veículo do lado da via de mão inapropriado ao sentido de direção” e pelo fato do condutor trazer consigo na cabine do veículo sua filha de 02 anos de idade, o que provaria que o requerido agiu com culpa grave consistente em imprudência e negligência.
Pleiteia, ainda, danos materiais no valor de R$ 169.320,00 (cento e sessenta e nove mil, trezentos e vinte reais) valor correspondente a 51 anos de trabalho com percepção de renda de 2/3 do salário mínimo vigente à época do sinistro.
Juntou documentos de fls. 10-25.
 Devidamente citado, o requerido apresentou contestação oportunidade em que alegou que o acidente não se deu como descrito na inicial uma vez que o requerido não agiu com imprudência ou negligência uma vez que não trafegava na contramão, nem acima da velocidade permitida e não estava distraído sendo que sua filha menor estava em cadeira própria; que o acidente se deu por culpa exclusiva dos representantes da vítima, em especial de sua genitora que se encontrava numa calçada conversando com vizinhos; que a Rua 31 de março tem tráfego nas duas mãos; que houve culpa exclusiva dos representantes da vítima, tanto que o pai do menor atribuiu a responsabilidade à mãe do menor, em plena via pública, uma vez que o menor saíra correndo no intuito de atravessar a rua e se encontrar com a mãe que estava do outro lado da via; que o requerido trafegava dentro da velocidade permitida e com as cautelas necessárias; que o menor saiu detrás de uma árvore para atravessar para o lado contrário da rua, momento em que veio a entrar na frente do veículo deste que freio mas não conseguiu evitar o acidente; que tal conclusão conta do auto de verificação de local de acidente; que tal fato é corroborado com a conclusão de que no momento do acidente a criança se encontrava 0.90 m da calçada, ou seja, no meio da via de trânsito; que em relação a alegação de que o requerido trafegava distraidamente por levar sua filha menor no interior do veículo também é inverídica uma vez que a mesma se encontrava em uma cadeira apropriada para crianças, não contribuindo de qualquer maneira para o fato; que não estão presentes os requisitos da responsabilidade civil; que inexiste nexo causal entre a conduta do requerido e o dano sofrido pelos autores; que no caso restou evidenciada a culpa exclusiva da vítima; que inexiste ato ilícito imputável ao requerido; que poderia ter ocorrido, no máximo, culpa concorrente; que é incabível o requerimento de pensão vitalícia; que inexiste dano moral indenizável uma vez que não há responsabilidade imputável ao requerido; finaliza requerendo a improcedência da ação.
Às fls. 45 realizou-se audiência preliminar a qual restou infrutífera, tendo este juízo determinado o apensamento da ação penal respectiva. Às fls. 47, o requerido juntou declaração do município indicando a inexistência de sinalização vertical ou horizontal na Rua 31 de março e fls. 48 juntou nota fiscal de compra de cadeira Galzerano.
Às fls. 50-55, o autor apresenta réplica oportunidade em que reafirma os fatos constantes da inicial e impugna os documentos juntados às fls. 47 e 48.
Às fls. 58 foi designada audiência de instrução a qual somente se realizou no dia 12.04.2012, oportunidade em que foram ouvidas duas testemunhas da parte autora, na mesma assentada foi deferido o requerimento de prova emprestada da ação penal nº 533/2008, uma vez que naquela ação os autores funcionaram como assistentes de acusação.
Às fls. 85, realizou-se audiência de continuação, oportunidade em que as partes declararam não ter outras provas a produzir em audiência, motivo pelo qual foi declarada encerrada a instrução.
Às fls. 89-98, os autores apresentaram alegações finais oportunidade em que reafirma a culpa exclusiva do requerido que trafegava do lado da via de mão inapropriado ao seu sentido de direção e trazendo uma menor de dois anos na cabine de seu veículo sem acondicionamento adequado; que o art. 29 do CTB revela que requerido deveria está circulando pelo lado direito da pista de rolamento, motivo pelo qual requer a procedência da ação.
Às fls. 100-102, o requerido apresenta alegações finais reafirmando os termos da contestação afirmando a inexistência de culpa por parte do requerido, a absolvição da seara penal, a inexistência de ato ilícito imputável ao requerido, motivo pelo qual requer a improcedência da ação. Juntou documentos de fls. 103-108, qual seja, a cópia da assentada criminal da ação penal que já foi deferida como prova emprestada.
Vieram os autos conclusos para sentença.

Eis o breve relato dos fatos. Passo a decidir.

2 - DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA.

2.1. MÉRITO
O direito civil consagrou um amplo dever legal de não lesar ao qual corresponde a obrigação de indenizar, aplicável sempre que, de um comportamento contrário àquele dever de indenizar, surtir algum prejuízo injusto para outrem.

Reza o art. 927 do Código Civil:

"Art. 927 - Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único: Haverá obrigação de reparar o dano independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem".

Definem os arts. 186 e 187 do mesmo diploma legal:
"Art. 186 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 187 - Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes" (grifo nosso).

Por conseguinte, ato ilícito é aquele praticado por terceiro que venha refletir danosamente sobre o patrimônio da vítima ou sobre o aspecto peculiar do homem como ser moral.

O dano moral é também consagrado como garantia constitucional, conforme prescreve o art. 5º, incisos V e X, da Constituição Federal:

"Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral, ou à imagem;
(...)
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação" (grifo nosso).


PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

                                      Para a configuração da responsabilidade civil, necessário se faz a demonstração da presença dos elementos da responsabilidade civil, quais sejam: a conduta (comissiva ou omissiva), o evento danoso, a culpa e nexo de causalidade. Deve ainda inexistir qualquer causa excludente da responsabilidade civil.
CONDUTA

A responsabilidade civil, tanto objetiva como subjetiva, deverá sempre conter como elemento essencial uma conduta.
Maria Helena Diniz assim a conceitua: "Ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou lícito, voluntário e objetivamente imputável, do próprio agente ou de terceiro, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado".
Portanto, podemos dizer que conduta seria um comportamento humano, comissivo ou omissivo, voluntário e imputável. Por ser uma atitude humana, exclui os eventos da natureza; voluntário no sentido de ser controlável pela vontade do agente, quando de sua conduta, excluindo-se, aí, os atos inconscientes ou sob coação absoluta; imputável por poder ser-lhe atribuída a prática do ato, possuindo o agente discernimento e vontade e ser ele livre para determinar-se.
No presente caso, restou devidamente demonstrada a conduta comissiva imputável ao requerido na medida em que restou incontroverso nos autos que o requerido dirigia o veículo que trafegava na Rua 31 de março e colidiu com a vítima, conforme se observa da contestação:
“ (...) Neste momento o requerido trafegava corretamente pela rua 31 de março, utilizando-se da velocidade permitida, bem como das cautelas necessárias. Porém, o menor saiu detrás de uma árvore para atravessar para o lado contrário da rua, momento em que veio a entrar na frente do veículo deste, o que impediria qualquer reação por parte do requerido (...)”.
No mesmo sentido o auto de verificação do local de acidente de trânsito de fls. 11-12:
“(...) O V1 trafegava na via pública 31 de março no sentido Prefeitura local, e conforme os relatos das testemunhas a vítima saiu bruscamente de dentro de sua residência no intuito de atravessar a via para ir ao encontro de sua mãe que se encontrava do outro lado da via, lhe aguardando, porém ao tentar atravessar a via, inadvertidamente, foi atropelada às margens da via pública a 90 (noventa) centímetros do meio fio do lado de sua residência, mesmo o veículo V1 tendo tido os freios acionados o mesmo não foi suficiente para parar o veículo a tempo de não atropelar a vítima, o impacto do atropelamento atingiu a cabeça da vítima e posteriormente o V1 passou por cima do corpo da mesma, porém desta vez não atingindo haja vista o corpo ter ficado na posição entre as rodas do V1.(...)”
EVENTO DANOSO

O dano representa uma circunstância elementar ou essencial da responsabilidade civil. Configura-se quando há lesão, sofrida pelo ofendido, em seu conjunto de valores protegidos pelo direito, relacionando-se a sua própria pessoa (moral ou física) aos seus bens e direitos. Porém, não é qualquer dano que é passível de ressarcimento, mas sim o dano injusto, contra ius, afastando-se daí o dano autorizado pelo direito.
O dano poderá ser patrimonial ou moral. Patrimonial é aquele que afeta o patrimônio da vítima, perdendo ou deteriorando total ou parcialmente os bens materiais economicamente avaliáveis. Abrange os danos emergentes (o que a vítima efetivamente perdeu) e os lucros cessantes (o que a vítima razoavelmente deixou de ganhar), conforme no art. 402 do novo Código. Já o dano moral corresponde à lesão de bens imateriais, denominados bens da personalidade (ex.: honra, imagem etc.).
O dano resta devidamente configurado através do atestado de óbito de fls. 14, onde consta como causa mortis PARADA CÁRDIO RESPIRATÓRIA, TRAUMATISMO CRÂNIO ENCEFÁLICO (VÍTIMA DE ATROPELAMENTO EM VIA PÚBLICA, NESTA CIDADE) e do exame cadavérico de fls. 15.

CULPA EM SENTIDO LATO
A noção jurídica de culpa abarca tanto a idéia de dolo, como a idéia contida na fórmula da “negligência, imprudência e imperícia”.
Por dolo entende-se o propósito de causar dano a outrem.
Já por culpa em sentido estrito, entende-se a inobservância de uma norma de conduta, seja por negligência (falta de cuidado por conduta omissiva), imprudência (falta de cuidado por conduta comissiva) ou imperícia (falta de habilidade no exercício de atividade técnica), que leva a um resultado não desejado, qual seja, a violação de um dever jurídico, ,causando dano a outrem. 
O conceito jurídico de culpa evoluiu, de modo a surgir o que chamam hoje de “concepção normativa de culpa”. Por essa concepção, a culpa passou a ser entendida como “o erro de conduta”, de modo que age com culpa aquele que age fora dos padrões de conduta esperados. Desse modo, para verificar se houve erro de conduta ou não (se houve culpa ou não), deve-se comparar a conduta concreta do agente causador do dano com a conduta que teria adotado o homem-padrão.
Ou seja, adota-se um modelo de comportamento esperado, baseado no parâmetro romanista do bonus pater famílias (o homem médio, prudente), e o compara com o comportamento do agente causador do dano, aferindo, assim, se esse agiu com culpa ou não. 

Portanto, a culpa se caracteriza quando há a violação de um dever objetivo de cuidado que se espera do homem médio. Sua caracterização depende da aferição dos chamados ELEMENTOS DA CULPA, quais sejam:

1) conduta voluntária e resultado involuntário;
2) previsão ou previsibilidade do resultado;
3) falta de cautela, cuidado, diligência.

No presente caso os requerente imputam ao requerido duas modalidades de culpa: a imprudência uma vez que o requerido estaria trafegando na contramão da pista de rolamento ou do lado esquerdo do sentindo de direção infringindo normas de transito e a negligência uma vez que estaria trazendo consigo sua filha de 02 anos de idade na cabine do veículo sem o necessário assento.

No caso em análise é evidente que o requerido trafegava em seu veículo de maneira voluntária tendo se envolvido em acidente de trânsito de maneira involuntária.
É evidente também que descumpriu o seu dever de cuidado objetivo uma vez, sem qualquer motivo explicitado nos autos,  trafegava pelo lado esquerdo da pista de rolamento infligindo normas de trânsito.
Entretanto, cumpre observar que a situação em que trafegava, ou seja, em velocidade compatível com a via ( conforme se infere dos depoimentos das testemunhas colhidos na instrução) em uma via de dupla mão de direção, conforme demonstrado a partir da declaração da municipalidade de fls. 47, não lhe era previsível no caso concreto antever que uma criança de tenra idade (01 ano e 08 meses de vida), desacompanhada de seu responsável (pai, mãe, avós, babá, etc) e sem a vigilância de qualquer pessoa, saísse “bruscamente de dentro de sua residência com o intuito de atravessar a via e ir ao encontro de sua mãe que se encontrava do outro lado” (fls. 11 e 12) não permitindo ao requerido o tempo de reação necessário para evitar o atropelamento, em que pese o acionamento do sistema de freios do veículo.
Também os autores não lograram êxito em revelar de que forma o fato de o requerido trazer consigo na cabine do veículo sua filha teria contribuído para o acidente.
Previsível é tudo aquilo que tem probabilidade de acontecer, não sendo razoável taxar como provável a brusca tentativa de uma criança de tenra idade de atravessar a rua, desacompanhada e sem vigilância dos pais ou responsáveis. No caso deve prevalecer o princípio da confiança, de forma que tal situação revela-se como excepcional.

Para Sérgio Cavalieri Filho a idéia de culpa está visceralmente ligada à responsabilidade, por isso que, de regra, ninguém pode merecer censura ou juízo de reprovação sem que tenha faltado com o dever de cautela em seu agir. Daí ser a culpa, de acordo com a teoria clássica, o principal pressuposto da responsabilidade civil subjetiva.
Caio Mário da Silva Pereira destaca: A essência da responsabilidade subjetiva vai assentar, fundamentalmente, na pesquisa ou indagação de como o comportamento contribui para o prejuízo sofrido pela vítima. Assim procedendo, não considera apto a gerar o efeito ressarcitório um fato humano qualquer. Somente será gerador daquele efeito uma determinada conduta, que a ordem jurídica reveste de certos requisitos ou de certas características. Assim considerando, a teoria da responsabilidade subjetiva erige em pressuposto da obrigação de indenizar, ou de reparar o dano, o comportamento culposo do agente, ou simplesmente a culpa, abrangendo no seu contexto a culpa propriamente dita e o dolo do agente. [...]
Segundo Carlos Roberto Gonçalves: Para obter a reparação do dano, a vítima geralmente tem de provar dolo ou culpa stricto sensu do agente, segundo a teoria subjetiva adotada em nosso diploma civil.
Sendo assim, desde meu olhar, não se infere a culpa imputada ao agente.
NEXO DE CAUSALIDADE

O nexo de causalidade consiste na relação de causa e efeito entre a conduta praticada pelo agente e o dano suportado pela vítima.
Nem sempre é tarefa fácil buscar a origem do dano, visto que podem surgir várias causas, denominadas concausas, concomitantes ou sucessivas. Quando as concausas são simultâneas ou concomitantes, a questão resolve-se com a regra do art. 942 do CC, que estipula a responsabilidade solidária de todos aqueles que concorram para o resultado danoso.
Porém, diante da problemática a respeito das concausas sucessivas, surgiram duas teorias a respeito:
a) TEORIA DA EQUIVALÊNCIA DAS CONDIÇÕES OU DOS ANTECEDENTES OU CONDITIO SINE QUA NON: estipula que existindo várias circunstâncias que poderiam ter causado o prejuízo, qualquer delas poderá ser considerada a causa eficiente, ou seja, se suprimida alguma delas, o resultado danoso não teria ocorrido.
b) TEORIA DA CAUSALIDADE ADEQUADA: para essa teoria, a causa deve ser apta a produzir o resultado danoso, excluindo-se, portanto, os danos decorrentes de circunstâncias extraordinárias, ou seja, o efeito deve se adequar à causa. O dano deve ser resultado direto e imediato da conduta.
A análise das provas colacionadas aos autos me conduzem à conclusão de que de fato o evento morte decorreu do atropelamento pelo veículo conduzido pelo requerido, entretanto, vislumbro na espécie uma causa de rompimento do nexo causal, qual seja: a culpa exclusiva da vítima.

INEXISTÊNCIA DE EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE

A responsabilidade civil será elidida quando presentes determinadas situações, aptas a excluir o nexo causal entre a conduta e o dano causado ao particular, quais sejam a força maior, o caso fortuito, o estado de necessidade e a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro.
A força maior é conceituada como sendo um fenômeno da natureza, um acontecimento imprevisível, inevitável ou estranho ao comportamento humano, p. ex., um raio, uma tempestade, um terremoto. Nesses casos, o Estado se torna incapacitado diante da imprevisibilidade das causas determinantes de tais fenômenos, o que, por conseguinte, justifica a elisão de sua obrigação de indenizar eventuais danos, visto que não está presente aí o nexo de causalidade.
Já na hipótese de caso fortuito, o dano decorre de ato humano, gerador de resultado danoso e alheio à vontade do agente, embora por vezes previsível. Por ser um acaso, imprevisão, acidente, algo que não poderia ser evitado pela vontade humana, ocorre, desta forma, a quebra do nexo de causalidade, daí a exclusão da responsabilidade diante do caso fortuito.
O estado de necessidade é também causa de exclusão de responsabilidade. Ocorre quando há situações de perigo iminente, não provocadas pelo agente, tais como guerras, em que se faz necessário um sacrifício do interesse particular em favor do Poder Público, que poderá intervir em razão da existência de seu poder discricionário.
A culpa exclusiva da vítima ou de terceiro é também considerada causa excludente da responsabilidade estatal, pois haverá uma quebra do nexo de causalidade, visto que o requerido não pode ser responsabilizado por um fato a que, de qualquer modo, não deu causa. Decorre de um princípio lógico de que ninguém poderá ser responsabilizado por atos que não cometeu ou para os quais não concorreu.
No caso dos autos, em que pese os autores terem tentado imputar a responsabilidade pelo óbito da vítima exclusivamente ao requerido, entendo que a conduta da vítima – uma criança de apenas 01 ano e 08 meses de vida -  de sair correndo de sua casa,  atravessar bruscamente a pista de rolamento em direção a sua genitora que se encontrava na margem oposta da via, desacompanhada de qualquer responsável e sob nenhuma vigilância, revela ao contrário do sustentado na inicial revela culpa exclusiva da vítima e grave omissão de seus responsáveis os quais podiam e deviam agir para evitar o resultado, bastando que não permitissem que o menor estivesse desacompanhado, sem qualquer vigilância e com as portas da casa abertas a permitirem a sua saída para o evento danoso:

“que o veículo passou na frente da depoente, nada lhe chamou a sua atenção, ou seja, o requerido não vinha em uma velocidade que chamasse a atenção da declarante; que logo em seguida observou quando a criança Paulo Junior, de dois anos de idade, ia saindo do portão da casa de sua avó materna, sozinho, “na carreira”; que quando o carro bateu na criança estava no asfalto; que a mãe da criança estava sentada na calçada do muro do Forum; que não sabe dizer se a autora deixou a criança sob os cuidados de algum adulto; que o requerido prestou socorro para o menor (...) (depoimento da testemunha LUCIANA SILVA, fls. 78)

“(...) QUE não recorda exatamente o dia, mas recorda que nesse dia retornava de sua colégio em companhia de uma amiga chamada Kaliane quando parou na calçada do forum para conversa com Dina, irmã da autora e a autora; que passados alguns minutos ouviu quando Dina comentou que o carro tinha passado por cima de uma pedra; que logo em seguida observaram que  a criança ora vítima saiu rolando por debaixo do carro(...) que não sabe dizer onde se encontrava a criança quando a depoente conversava com a mãe em frente ao Forum; que a velocidade do veículo não chamou a atenção da depoente; que o local do atropelamento foi  próximo ao meio fio das casas que ficam em frete ao fórum; (...) que não sabe dizer se Chaleis possuía babá que cuidasse do seu filho; que não sabe explicar porque a criança que na época tinha aproximadamente 02 anos estava andando sozinha na rua; que explicita que o acidente ocorreu em frente a casa da avó materno da criança; que os avós maternos estavam em casa e logo saíram gritando de dentro de casa em atitude de desespero  (...)(depoimento de ALICE CONCEIÇÃO, fls. 79)

Assim, pelos depoimentos colacionados, restou evidenciada a culpa exclusiva da vítima e a omissão relevante dos responsáveis legais da criança os quais, por lei, tem a obrigação de cuidado, proteção e vigilância, podendo, em tese, até caracterizar uma delito comissivo por omissão, nos termos do art. 13, §2º, a do CPB.

DOS DANOS MATERIAIS

                                      Quanto aos danos materiais pleiteados, consistentes no arbitramento de pensão mensal aos requerentes, em função da presunção de contribuição que o filho menor daria à família, também seguem a mesma sorte da análise supra dos requisitos da responsabilidade civil.
                                      Assim, havendo rompimento do nexo causal por culpa exclusiva da vítima e de terceiros, inexiste o dever de indenizar.

3- DO DISPOSITIVO.

Em face do exposto, JULGO IMPROCEDENTE a presente demanda.
Condeno ainda os autores que custas e despesas processuais e honorários advocatícios no valor de R$ 1000,00, a teor do que dispõe o art. 20, §4º do CPC, porém, dispenso o pagamento tendo em vista que neste momento defiro os benefícios da justiça gratuita.
P. R. I.

Amarante do Maranhão, 19 de junho de 2012.

 


Glender Malheiros Guimarães

Juiz de Direito Titular

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