quinta-feira, 19 de abril de 2012

SENTENÇA CONDENATÓRIA. ESTUPRO DE VULNERÁVEL.

Processo n.º 887/2009
Autor: Ministério Público Estadual
Réu: ANTONIO CARDOSO DA SILVA, vulgo MANGA

S E N T E N Ç A


I- RELATÓRIO

O Ministério Público Estadual, através de seu representante legal, no uso de suas atribuições legais e constitucionais, ofereceu denúncia em face de ANTONIO CARDOSO DA SILVA, qualificados às fls. 02, como incurso nas sanções do art. 217-A do Código Penal Brasileiro, com arrimo nos fatos que seguem.
Consta do inquérito policial em anexo que a criança E S S (06 anos), no dia 15.08.2009, por volta das 12 h, no interior de seu lar, situado na Rua Castelo Branco, 22, Bairro Industrial, foi estuprada pelo ora denunciado, quando a mesma estava sozinha com o seu agressor.
Consta, ainda, das páginas do citado caderno policial, que o denunciado, quando estava assistindo televisão na casa da mãe de criação da vítima colocou o pênis para fora da calça e mandou que a criança passe a segurá-lo com a intenção de fazer carícias em seu órgão genital.

A denúncia foi recebida no dia 26.11.2009, fs. 34, tendo sido determina a citação do acusado e após foi-lhe nomeado defensor dativo.
A defesa prévia foi apresentada às fls. 41-43, com pedido de apresentação de testemunhas em banca, oportunidade em que negou a autoria do delito; finalizou requerendo a absolvição sumária.

O recebimento da denúncia foi mantido às fls. 45, tendo sido designada audiência de instrução.
Às fls. 52-55, a audiência foi realizada oportunidade em que foram ouvidas três testemunhas de acusação, tendo a mesma sido suspensa para a oitiva das testemunhas não localizadas.
Às fls. 60-61 realizou-se audiência de continuação, oportunidade em que se procedeu à oitiva da avó de criação da vítima, tendo o Ministério Público desistido da oitiva da vítima. Após, foi decretada a revelia do acusado que fugiu após receber a liberdade provisória, motivo pelo qual foi decretada a sua prisão preventiva.
Foi declarada encerrada a instrução e os autos remetidos às partes para apresentação de memoriais, tendo em vista a complexidade do fato.
O Ministério Público Estadual apresentou alegações escritas às fls. 70-76, pugnando pela procedência da pretensão acusatória, com a conseqüente condenação do réu.
A defesa, por seu turno, em alegações finais sustenta a insuficiência de provas, que as declarações da vítima devem ser analisadas com ressalvas e afirma a atipicidade da conduta do denunciado uma vez que a cena presenciada pelas testemunhas teria sido acidental, inexistindo dolo por parte do agente.

 É o relatório, passo a decidir.

II - FUNDAMENTAÇÃO.
        
Da Imputação Inicial.

Ao réu ANTONIO CARDOSO DA SILVA foi imputada a prática do crime previsto no art. 217-A do Código Penal Brasileiro, introduzido no ordenamento pela Lei nº 12015/09 de 07.08.2009, in verbis:
Estupro de vulnerável 
Art. 217-A.  Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: 
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos. 
§ 1o  Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência. 


Legalmente e doutrinariamente, infere-se que pela teoria finalista da ação, crime é toda ação ou omissão típica, ilícita e culpável.

Nestas condições, e considerando os elementos de cognição existente nos autos, passo a apreciar a conduta imputada ao aludido réu.

Tipicidade.

Esta cuida da adequação de um fato cometido à conduta descrita na lei penal.
A materialidade está comprovada com o lastro probatório coligido aos autos, ou seja, as provas testemunhais produzidas durante a instrução processual, por testemunhas oculares do delito estando em consonância com depoimento da vítima em sede de inquérito policial, que em crimes dessa natureza, normalmente cometido às escondidas, a palavra da vítima tem um peso fundamental para elucidar a verdade.

As testemunhas ouvidas em Juízo apresentaram uma versão uniforme e que se complementam, corroborando as demais provas produzidas em fase inquisitiva. Vejamos.
 (...) eu estava em minha casa e sai até a casa da minha mãe que é vizinha e ao retornar encontrei o acusado na casa, em pé, próximo a mesa da sala, com a braguilha da calça aberta, com a Eliana segurando seu pênis (depoimento de LUIZA GOMES, fls. 53).

(...) estava de plantão quando chegou comunicado da ação da ocorrência de que o acusado havia colocado o pênis para fora da calça para que a vítima pegasse; O que disse o acusado? Na delegacia ele confirmou o ocorrido (depoimento de ANTONIO ALVES OLIVEIRA FILHO, FLS. 54)

(...) que no dia dos fatos a depoente estava em sua casa que fica ao lado da casa da vítima; que por volta do meio dia sua filha Luzia, mãe de Eliana, entrou correndo na casa da depoente e disse que tinha flagrado a vítima segurando o pênis do acusado; que Luzia ficou muito assustada e foi chamar a declarante; (...) que o acusado não consumou a penetração pois a vítima fez exame e nada constatou (depoimento de MARIA DALVA SOUZA, FLS. 61)

Em seu interrogatório policial, o réu não negou que a vítima tivesse segurado seu pênis, mas afirma que foi acidental:

(...) que logo após a menor Eliana desequilibrou-se quase caindo ao solo oportunidade em que a mesma segurou no pênis do conduzido sendo que nesse exato momento LUIZA DE SOUSA adentra a sala e flagra a cena citada pelo conduzido; que nesse momento o conduzido ficou tranquilo alegando que não devia nada (...) que após sofrer as agressões dos familiares da vítima o conduzido seguiu para o seu local de trabalho, o bar de Dona Dalva onde o mesmo foi encontrado pelos policiais, preso e conduzido para esta delegacia (...) que não tinha intensão de fazer sexo com a menor Eliana e que na verdade do que aconteceu foi um acidente (INTERROGATÓRIO POLICIAL DE ANTONIO CARDOSO DA SILVA, FLS. 09)

Assim, pelos depoimentos das testemunhas não resta dúvida acerca do cometimento do delito pelo qual o acusado foi denunciado, principalmente, porque a instrução processual revelou que existem testemunhas oculares do delito. Ademais o depoimento da vítima, mesmo tendo sido tomando exclusivamente na fase policial,  assume maior relevância por estar em consonância com as demais provas dos autos. Segue jurisprudência a respeito do tema:

T J S C: “.....Em tema de crimes contra os costumes, que geralmente ocorrem às escondidas, as declarações da vítima constituem prova de grande importância, bastando por si só para alicerçar o decreto condenatório, mormente se tais declarações mostram-se plausíveis, coerentes e equilibradas, e com o apoio em indícios e circunstâncias recolhidas  no processo “(JTAC 76 / 63)
                                    
TJRS: “Estupro. Importância  da palavra da vítima como meio de prova. Em delitos dessa natureza, cometidos na clandestinidade, não havendo qualquer indício de que a imputação seja criação mental movida por interesses escusos, a palavra da ofendida, coerente com outros elementos colhidos nos autos, autoriza a condenação, máxima quando o réu invocou álibis contraditório e não provou nenhum” (RJTJERGS 181 / 147).
             
“Nos crimes desta natureza prevista no Art. 213 do Código Penal, a prova resulta das declarações da vítima, prestadas de forma verossímil notadamente quando confirmadas pelos demais elementos existentes nos autos”. ( 3º CC do TJ – SP no cap. 18-015, Ver dos Tribunais 170 / 191).

TJSC-037710) CRIME CONTRA A LIBERDADE SEXUAL - ESTUPRO COM PRESUNÇÃO DE VIOLÊNCIA (ART. 213 C/C ART. 224, "A", DO CÓDIGO PENAL).
Acusado que, aproveitando-se da pequena vítima, à época com 11 anos, mas com idade mental entre 08 e 09 anos, para ganhar sua confiança, presenteia-lhe com cartões telefônicos e dinheiro, permitindo, assim, sua aproximação e consumação do coito, em três oportunidades. Declarações seguras e coerentes da ofendida, corroboradas por outros testemunhos. Prova suficiente para dar suporte ao decreto condenatório. Nos crimes contra os costumes, geralmente cometidos na clandestinidade, os depoimentos testemunhais das vítimas, quando claros, coerentes e harmônicos, com apoio nos autos, são bastante para embasar o decreto condenatório.
Substituição da reprimenda corporal por restritiva de direitos. Impedimento legal à concessão da benesse haja vista o montante de pena aplicado. Dicção do artigo 44 do Estatuto Repressivo. Regime de cumprimento de pena integralmente fechado. Declaração incidental de inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/900 em decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal. Edição, ademais, da Lei nº 11.464/2007, alteradora da Lei 8.072/90, que expressamente conferiu a possibilidade de progressão de regime aos crimes hediondos ou equiparados. Aumento do período de cumprimento de pena para concessão da benesse, todavia, inaplicável aos fatos típicos ocorridos anteriormente à sua vigência. Extirpação da vedação operada no decisum. Recurso parcialmente provido.
(Apelação Criminal nº 2005.012113-4, 1ª Câmara Criminal do TJSC, Rel. Túlio Pinheiro. unânime, DJ 05.06.2007).

Dessa forma, a autoria restou indene de dúvidas, pois o réu não negou a ocorrência dos fatos, em que pese ter afirmado que decorreram de um acidente, versão que não encontra respaldo em qualquer outra prova dos autos, o que leva a crer que o fato denunciado ocorreu na forma narrada por vítima e testemunhas, já que afirma que estava no local e horário, juntamente com a vítima, sendo irrelevante o consenso ou dissenso da mesma diante de sua tenra idade e imaturidade sexual, especialmente por ser virgem à época dos fatos.

Quanto ao elemento subjetivo do tipo o mesmo restou evidenciado e constituiu-se na ação livre e deliberada do agente de praticar ato libidinoso diverso da conjunção carnal com a vítima de apenas 06 (seis) anos de idade na época dos fatos.

Quanto a tese defensiva, de ausência de provas suficientes para a condenação, aquela restou devidamente afastada pelo que já se demonstrou da análise e valoração probatória. Quanto a alegação de que os fatos teriam ocorrido de maneira acidental e não voluntária, tal versão não é corroborada por qualquer outra provas dos autos de forma que não merece credibilidade.

A conduta do acusado se coaduna, perfeitamente, com o preceito apresentado na denúncia, vez que as provas dão conta da consumação do delito,  restando ainda provados pelas declarações das testemunhas e vítima que ocorreu um único ato libidinoso.

Por todas as considerações acima, não se pode aplicar o princípio in dubio pro reo, já que pelo lastro probatório coligido aos autos não resta qualquer dúvida, seja quanto à autoria ou quanto à materialidade delitiva.

Antijuridicidade ou Ilicitude.

Esta cuida da relação de contrariedade entre o fato típico e o ordenamento jurídico pátrio, sendo que na hipótese em análise não ocorreu qualquer causa de exclusão da ilicitude em favor do réu.

Culpabilidade.

Para a teoria finalista da ação citada, a culpabilidade é composta pela imputabilidade, exigibilidade de conduta diversa e potencial consciência da ilicitude do fato.

No caso em comento, o réu à época dos fatos já era maior de idade, portanto, imputável, por suas condições pessoais tinha plenas condições de saber da ilicitude do fato, bem como podia agir de conformidade com o ordenamento jurídico.
III – DISPOSITIVO.

Por todo o exposto, julgo procedente a denúncia, para condenar o réu ANTONIO CARDOSO DA SILVA, vulgo MANGA, nas sanções do art. 217-A, caput,  do Código Penal Brasileiro.
Passo à fixação das penas cabíveis na espécie.

FIXAÇÃO DA PENA-BASE – Art. 59 do CPB.

Em análise da culpabilidade, concluo que o resultado estava dentro da esfera de previsibilidade do réu, sendo pessoa imputável e que poderia apresentar conduta diversa. Sobre os antecedentes, não existe registro de outra condenação, portanto, o réu é portador de bons antecedentes. A conduta social é boa. A sua personalidade não revela tendência enfermiça, inexistindo dados que apontem negativamente em relação á referida circunstância. Os motivos do crime foram reprováveis, eis que só pensou na satisfação da própria libido. As circunstâncias do crime são desfavoráveis ao réu, uma vez que o crime ocorreu no interior da casa da vítima. As conseqüências do crime são normais para o crime em espécie, não resultando no desvirginamento da menor. Sobre o comportamento da vítima, não contribuiu para o evento delituoso. Diante da análise supra, em sendo as condições judiciais favoráveis, fixo a pena-base em 08 (oito) anos de reclusão.

ATENUANTES E AGRAVANTES.

Não existem circunstâncias atenuantes ou agravantes.

CAUSAS DE DIMINUIÇÃO OU DE AUMENTO DE PENA.

Não existem causas de redução de pena, motivo pelo qual torno a pena definitiva em 08 (oito) ANOS DE RECLUSÃO.

Para regime de cumprimento pena privativa de liberdade acima aplicada fixo o regime inicialmente fechado, nos termos do que determina a Lei 8.072/90.

Incabível, na espécie, o sursis ou a substituição por pena restritiva de direitos, nos termos do art. 44 do CPB, diante do quantum da pena aplicada.

A pena de reclusão deverá ser cumprida no Complexo Penitenciário de Pedrinhas deste Estado.

Tendo em vista que o réu continua foragido desde a época em que fora beneficiado com a liberdade provisória, não havendo notícias do seu paradeiro, determino a sua prisão preventiva como garantia de aplicação da lei penal, uma vez que se trata de crime grave, equiparado a hediondo, punível com pena máxima superior a 04 anos de reclusão, nos termos do art. 312, caput, c/c art. 313, I do CPP. EXPEÇA-SE MANDADO DE PRISÃO.
Condeno o réu, ainda, em custas e despesas processuais, porém, dispenso o pagamento tendo em vista a hipossuficiência econômica do réu.

Transitada em julgado a sentença:

1) Seja lançado o nome dos réus no rol dos culpados nos termos do art. 393, II do CPP, bem como providenciar o registro no rol dos antecedentes criminais.
2) Oficie-se à Justiça Eleitoral em atenção ao art. 15, III da Constituição Federal;
3) Expeça-se guia de execução definitiva, encaminhando-a a vara de Execuções Penais de São Luís/MA, para acompanhamento.
P.R.I.
Amarante do Maranhão/MA, 16 de abril de 2012.



Glender Malheiros Guimarães
Juiz de Direito Titular 

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